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Coronavírus cria incerteza para leilões de energia e analistas defendem adiamentos

A pandemia global de coronavírus e seus desdobramentos sobre a economia têm gerado uma onda de incertezas em relação aos próximos leilões do governo no Brasil para novos projetos de energia, principalmente os que envolvem fontes renováveis, como usinas solares e eólicas, disseram especialistas à Reuters.

As licitações do setor elétrico atraíram nos últimos anos intenso apetite de investidores mesmo em meio a uma recessão histórica do país, mas agora preocupações sobre o comportamento de fatores como câmbio e custos de captação de recursos já levam consultores a defender até a postergação de ao menos algumas das disputas.

Estão agendados para 30 de abril leilões para contratar térmicas a gás e carvão em substituição a usinas em operação cujos contratos vencerão nos próximos anos. Em 28 de maio, deve ocorrer o leilão A-4, para novos projetos de geração renovável.

Estão previstas, ainda, uma licitação para projetos de geração incluindo termelétricas em setembro (A-6), e dois certames de concessões para a construção de linhas de transmissão, em junho e dezembro.

“Os clientes têm nos procurado e sinalizado muita dúvida no momento de preparar suas ofertas. Em algumas tecnologias os equipamentos são importados e com isso tem muita incerteza do câmbio”, disse à Reuters o presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso.

A moeda norte-americana está em franca disparada desde o início da crise do coronavírus e acumula valorização de mais de 25% frente ao real em 2020.

Enquanto o estresse nos mercados pode levar empresas a projetar cenários pessimistas, o que aumentaria os preços da energia nos leilões e prejudicaria consumidores, eventuais apostas em cenários mais otimistas que não se concretizem à frente podem gerar risco de abandono de projetos, apontou Barroso.

“Essa poderia ser uma razão para cogitar o adiamento”, afirmou ele, apontando que uma decisão nesse sentido poderia ser “prudente” ao menos para os leilões A-4 e A-6, que sofreriam maior impacto de fatores como o câmbio.

“Acho que seria uma medida inteligente parar para pensar. Eu adiaria o cronograma desses leilões. Nessa hora, é como se a gente estivesse em um quarto escuro, e todo mundo vai dando passos bem curtos para não tropeçar”, disse o vice-presidente de Estratégia e Novos Negócios da Electra Energy, Edvaldo Santana.

Além da tensão entre os investidores, ele ressaltou que o coronavírus pode gerar efeitos significativos sobre a demanda por energia, o que impactaria até mesmo a necessidade de contratação das novas usinas nos certames.

“É um pouco arriscado falar isso, mas acho que se o problema durar mais três meses vamos ter uma queda do consumo em 2020 que vai ser inédita em relação a períodos sem racionamento, vai ser muito grande. Espero estar errado”, apontou Santana, que é ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Procurado, o Ministério de Minas e Energia afirmou em nota que “está acompanhando a evolução do Covid-19 e seus impactos sobre o mercado de energia”, mas destacou que “por ora, esses leilões estão mantidos”.

Alternativamente, a PSR sugere que o governo amplie o prazo para que distribuidoras definam quanto em energia comprarão nas licitações, o que poderia evitar cenários de sobrecontratação.

RENOVÁVEIS EM XEQUE
A avaliação entre especialistas é de que todas licitações podem ser impactadas de alguma maneira, mas a maior preocupação é com o leilão A-4, mais próximo e voltado principalmente a usinas eólicas e solares.

Projetos fotovoltaicos são os que mais dependem de equipamentos produzidos na China e cotados em dólares, o que já fez empresas desistirem de investimentos no Brasil em 2016, após um salto da moeda dos EUA em meio à recessão e impeachment de Dilma Rousseff.

Com isso, o governo acabou por promover em 2017 um inédito “leilão reverso”, no qual diversas empresas pagaram pelo direito de abandonar seus projetos sob penalidades menores que as previstas em contrato.

“O fato de energia ser um investimento de longo prazo reduz um pouco esses efeitos, mas uma série de decisões têm de ser feitas agora, como pré-contratos de equipamento”, disse o consultor Tiago de Barros, ex-diretor da Aneel.

“Já tivemos no passado um problema com solar porque o dólar disparou”, lembrou ele, pontuando que nesse cenário seria difícil para investidores na fonte repetir a redução recorde de preços das últimas licitações.

Os impactos das incertezas seriam menores para o leilão de térmicas agendado para abril e para os certames de transmissão, mas mesmo neles poderia se esperar uma menor agressividade nas licitações, em uma importante virada de tendência.

O último leilão de projetos de transmissão, em dezembro, registrou deságios recordes na receita teto oferecida aos investidores, de 60%.

“Estava todo mundo bem otimista, e agora está todo mundo no mínimo com muitas dúvidas. Diria que hoje a estimativa inicial é de que todos leilões vão ter menos deságio, está todo mundo exigindo mais retorno”, disse o sócio da consultoria Thoreos, Rodrigo de Barros.

Os mais recentes leilões de geração do Brasil atraíram interesse de gigantes como a chinesa CGNEI, a francesa EDF, a norueguesa Statfrakt e a canadense Canadian Solar.

Já em transmissão a disputa contou com a colombiana ISA, a espanhola Iberdrola e a chinesa State Grid, por meio dos braços locais ISA Cteep, Neoenergia e CPFL, além das brasileiras Equatorial, Energisa e Taesa e diversas empresas de menor porte e fundos de investimento.

Fonte: Reuters

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