Soja do Brasil ganha espaço: pela 1a vez, Mato Grosso está ‘mais perto’ da China que Iowa
Os produtores de soja americanos, que enfrentam simultaneamente gargalos logísticos e a alta do dólar frente às principais divisas internacionais, acabam de perder uma vantagem competitiva histórica para seu maior rival no mercado global: o Brasil.
Por muitos anos, levar a soja do Brasil para a China custava o dobro do que transportá-la das regiões produtoras dos EUA para o mercado chinês.
Mas, agora, segundo dados do Departamento de Agricultura dos EUA, o preço da logística e do transporte entre a soja americana e a brasileira praticamente se igualou. Ou seja, um importador chinês está pagando o mesmo para buscar soja em Iowa ou em Mato Grosso.
Iowa é o segundo maior produtor de soja nos EUA, enquanto Mato Grosso lidera o cultivo no Brasil. A oleaginosa é usada para praticamente tudo em alimentação – desde ração animal como para óleos de cozinha, além de ingrediente básico em alimentos processados.
E, apesar da disparada do preço do combustível este ano, que afeta o custo do frete, os problemas logísticos dos EUA eliminaram a distância competitiva da soja brasileira.
O maior desde 2017: Brasil lidera investimentos chineses no mundo – US$ 5,9 bi no ano passado
Segundo estudo da Universidade da Califórnia em Davis e da Universidade de Connecticut, gargalos da pandemia, como portos congestionados, falta de contêineres e outros, derrubaram em US$ 10 bilhões as exportações agrícolas americanas.
O Brasil, por outro lado, está colhendo agora os frutos dos investimentos feitos no Arco Norte – rota para distribuição de soja via portos da Região Norte, que reduziu em 1.600 quilômetros e dois dias de viagem o transporte de grãos do Centro-Oeste até seu embarque em navios. Na última década, as exportações de milho e soja pelo Arco Norte foram multiplicadas por seis, segundo a Confederação Nacional da Agricultura.
Desde 2008, o Brasil investiu R$ 290 bilhões em melhorias em portos e rodovias. O Porto de Santos deve ampliar sua capacidade em 50%, para 240 milhões de toneladas anuais em 2040, segundo previsões de Bruno Stupello, diretor de Desenvolvimento de Negócios e Regulação do terminal.
Mas há, é claro, o peso do câmbio. O real foi a segunda moeda que mais se desvalorizou frente ao dólar desde o início de 2020, atrás apenas do iene japonês, com queda de 18%.
– O Brasil está mais competitivo, porém uma enorme parte disso é graças ao câmbio – afirma Thiago Pera, especialista em logística na agricultura da Universidade de São Paulo. – Se os mercados se estabilizarem e o real se fortalecer, esse ganho frente aos EUA será perdido. Então o Brasil precisa investir na infraestrutura a um ritmo maior do que a expansão da produção agrícola nos próximos anos – completa.
Os Estados Unidos, por sua vez, preveem fortes investimentos em infraestrutura. Um pacote aprovado pelo governo em 2021 vai destinar US$ 17 bilhões a portos e dezenas de bilhões de dólares a estradas e ferrovias. Ao mesmo tempo, os operadores privados de portos marítimos planejam investimentos de US$ 33 bilhões por ano até 2024.
– Apesar dos avanços recentes, os desafios logísticos vão persistir no Brasil pelos próximos anos, há um enorme déficit em infraestrutura – afirma Joana Colussi, pesquisadora em agricultura da Universidade de Illinois.
Fonte: O Globo