Opinião

Marcelo Sammarco: BR do Mar e as perspectivas para a navegação costeira

Com 7.500 quilômetros de costa navegável, o Brasil possui vocação natural para a navegação costeira. Soma-se a isso o fato de que cerca de 80% da população brasileira vive em até 200 quilômetros da costa litorânea.

No entanto, o país conta hoje com alta concentração de cargas no modal rodoviário, o que se evidencia não só pelos números, mas também pela greve dos caminhoneiros deflagrada em maio de 2018, que paralisou diversas atividades e impediu a circulação de mercadorias naquele período.

Recentemente, a Casa Civil da Presidência da República publicou a Resolução nº 70, de 21 de agosto de 2019, anunciando oficialmente as diretrizes para a implantação da política nacional de estímulo ao transporte aquaviário de cabotagem.

O objetivo do programa é aumentar a participação do modal aquaviário no transporte de cargas, com o objetivo de reorganizar a matriz logística nacional, visando aumento de concorrência, eficiência e redução de custos no setor de transportes. A ideia é fomentar a utilização do transporte rodoviário para distâncias curtas e a navegação costeira para percursos mais longos, o que faz todo o sentido em razão das características geográficas do país.

No entanto, o programa “BR do Mar” trata apenas da cabotagem e não faz referência aos serviços feeder, tampouco estabelece a devida distinção entre as operações feeder e cabotagem.

Explica-se: nos termos da Lei nº 9.432 de 1997, o transporte aquaviário de cabotagem é aquele realizado entre portos ou pontos do território brasileiro. Ou seja, pressupõe que tanto a origem quanto o destino da carga estejam localizados no país (a mesma definição encontra-se estabelecida nas Resoluções da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) 01 de 2015 e 18 de 2017.

De outro lado, entende-se por feeder o serviço prestado pelo transportador aquaviário para interligar portos principais ou concentradores (hub-ports) a portos secundários, ou vice-versa, mediante procedimento de baldeação. Na operação feeder, portanto, a carga objeto de transporte tem como origem ou destino portos internacionais e pressupõe, em uma das etapas, a realização de transporte de longo curso.

Na prática internacional, a totalidade do transporte, desde o porto de origem, passando pelo porto secundário, onde é feita a baldeação até a descarga no porto de destino, é coberta por um único Bill of Lading, o que implica em redução de custos e de atos burocráticos, facilitando a circulação de carga, o que, em última análise, beneficia sobremaneira o usuário do transporte.

Considerando o expressivo volume de cargas que poderão ser movimentadas nos serviços feeder (cuja operação está diretamente relacionada ao transporte de longo curso), o incremento da navegação costeira poderá ser potencializado com a inclusão da regulamentação destes serviços feeder no programa BR do Mar.

Para tanto, há que se incluir no texto legal denominado BR do Mar a distinção entre a cabotagem e os serviços feeder para permitir a abertura da atividade para empresas estrangeiras de navegação, o que é juridicamente viável e que beneficiará todos os agentes da cadeia logística e de comércio exterior, especialmente os usuários do transporte e a indústria nacional, bem como toda a coletividade brasileira, cuja medida não traria nenhum prejuízo ao mercado de cabotagem, posto que são modalidades destinadas a diferentes tipos de cargas e que não concorrem entre si.

Fonte: A Tribuna

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