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Reforma Tributária e desoneração da folha fazem setor repensar ecossistema logístico do país

Impacto de aspectos regulatórios no segmento terá espaço na agenda do Logística do Futuro, evento promovido pela Mundo Logística nos dias 2 e 3 de outubro, em São Paulo.

O Brasil está entre os países com maior carga tributária no mundo, com destaque para a tributação sobre bens e serviços, que representa 13,05% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse percentual supera a média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que é de 10,8%, além de países como Reino Unido (10,1%), Canadá (8,8%) e Chile (10,6%).

No setor logístico, essa alta carga tributária representa um entrave significativo para a competitividade das empresas que operam no Brasil. A recente aprovação da Reforma Tributária pelo Congresso Nacional trouxe novas questões à tona, gerando discussões sobre os impactos dessas mudanças na logística e em outros setores da economia.

O vice-presidente jurídico da Associação Brasileira de Logística (Abralog), Alessandro Dessimoni, alertou que o cenário tributário brasileiro, já considerado um dos mais complexos do mundo, poderá se tornar ainda mais desafiador com as reformas em curso. “O nosso país precisará enfrentar desafios e complexidades significativas no campo tributário. Isto se deve às várias mudanças legislativas ocorridas no final de 2023, que moldaram o panorama fiscal global”, disse.

Aprovada no final de 2023, a Reforma Tributária traz alterações significativas para o setor logístico, principalmente no que se refere à tributação no consumo. A principal mudança envolve a substituição de tributos como o ICMS e o ISS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), um tributo sobre valor agregado que deverá ser aplicado no destino, e não na origem, como era anteriormente.

LOGÍSTICA TRIBUTÁRIA

A mudança, que visa equalizar a tributação entre estados e eliminar a guerra fiscal, impactará na malha logística das empresas. Hoje, em função das diferentes alíquotas a depender do estado, o ICMS é critério elementar para o posicionamento de uma rede logística. Segundo o especialista sócio-diretor da Prosperity Consultoria, Décio Tarallo, aspectos como substituição tributária, benefícios fiscais e o sistema de crédito/débito complicam os estudos logísticos e frequentemente limitam as empresas a adotarem modelos de Supply Chain baseados apenas em produtividade operacional.

“A legislação brasileira, com altos custos para as empresas, pressiona os gestores a buscarem alternativas mais baratas para se terem negócios saudáveis e competitivos”, explicou Tarallo. “Alguns governos estaduais promovem benefícios fiscais atraentes para as empresas que queiram se instalar nas suas regiões, mesmo com poucas contrapartidas das empresas, apenas mantendo o faturamento anual mais a inflação, com vendas para o próprio estado e para outros com reduções que chegam a quase 90% do ICMS.”

Um exemplo prático desse impacto pode ser na operação de empresas como a Campari, empresa italiana de bebidas que opera no Brasil desde 1963. Em debate promovido pela MundoLogística na inauguração do complexo logístico da HSI em Guarulhos (SP), a diretora de Supply Chain da companhia, Renata Fioravante, explicou que a Campari possui uma planta industrial estrategicamente localizada em Pernambuco, onde recebe benefícios fiscais significativos. No entanto, com a implementação do IBS, esses incentivos podem deixar de ser vantajosos.

“Hoje, minha planta em Pernambuco atende o Rio de Janeiro com um custo logístico elevado, mas os incentivos fiscais compensam. Com a nova tributação no destino, o cenário pode mudar drasticamente, e talvez eu precise repensar a localização da minha indústria, considerando o consumo concentrado no Sul e Sudeste”, afirmou.

Apesar das incertezas, a Reforma Tributária também abre oportunidades para setores como o farmacêutico. Ricardo Canteras, diretor comercial da Temp Log, salientou que a simplificação tributária, com a isenção de impostos sobre medicamentos, pode transformar o Brasil em um hub logístico global para a indústria farmacêutica.

“A redução dos custos operacionais pode tornar os medicamentos brasileiros mais acessíveis e competitivos no mercado internacional, atraindo investimentos e ampliando a demanda por serviços logísticos especializados”, afirmou o executivo.

IMPACTO EM REAL ESTATE

A adaptação às novas realidades fiscais e logísticas trará desafios também para o mercado de real estate. Durante o evento da HSI, a sócia-fundadora e CEO da EREA, Clarisse Etcheverry, destacou que as empresas precisarão encontrar soluções inovadoras e flexíveis para atender às demandas logísticas crescentes. “Veremos um aumento na demanda por armazenagem dentro dos grandes centros urbanos, especialmente com a consolidação de operações e a terceirização de serviços logísticos.”

No entanto, Francisco Tarosso, diretor sênior de Logística e Supply Chain da CEVA no Brasil e no Chile, apontou que essa migração das operações para os grandes centros urbanos pode sobrecarregar a infraestrutura logística do país. “Temos um longo caminho a percorrer em termos de infraestrutura portuária, rodoviária e de galpões logísticos. O governo precisará agir rapidamente para garantir que essas mudanças não prejudiquem o setor”, afirmou.

O executivo pontuou ainda a necessidade de planos contingenciais por parte do governo para mitigar os impactos negativos da reforma, especialmente em regiões que podem perder competitividade com a mudança da tributação para o destino.

DESONERAÇÃO DA FOLHA DE PAGAMENTOS

Outro tema sensível para o setor, especialmente para o transporte rodoviário de cargas, é a desoneração da folha de pagamentos. Implementada em 2011 para reduzir os encargos trabalhistas e estimular a geração de empregos, a política tem sido um tema de intensas negociações entre o governo e o Congresso Nacional. Em 2024, essa política continua a ser uma questão central para setores estratégicos, como o transporte de cargas.

Após um veto do Governo Federal no fim do ano passado, a medida — que permite a 17 setores da economia, incluindo transporte, pagarem alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, ao invés de 20% sobre a folha de salários — foi estendida até o fim deste ano. O cronograma proposto prevê uma redução gradual até 2028.

Segundo as entidades do setor, a desoneração é considerada essencial para o transporte de cargas, em função da geração de empregos possível por meio da medida. Em entrevista exclusiva para a MundoLogística, a diretora-executiva da Associação Brasileira de Operadores Logísticos (ABOL), Marcella Cunha, destacou que a reoneração da folha de pagamentos resulta em impactos diretos na capacidade das empresas de manter e expandir seus quadros de funcionários.

“A desoneração nos permite não apenas manter os empregos, mas também investir na qualificação e nas condições de trabalho dos nossos colaboradores. Sem ela, muitas empresas podem rever seus projetos, o que resultaria em uma cadeia de efeitos negativos para o setor”, afirmou.

LOGÍSTICA DO FUTURO

O impacto dos aspectos regulatórios no setor terá espaço na agenda do Logística do Futuro, evento promovido pela MundoLogística que reunirá profissionais e especialistas do setor para discutir e explorar as tendências, inovações e melhores práticas que moldarão o futuro da logística.

Com mais de 70 palestrantes e 80 empresas expositoras, o evento será realizado nos dias 2 e 3 de outubro no Transamérica Expo, em São Paulo. As inscrições podem ser realizadas no site oficial: https://logisticadofuturo.com.br/.

 

 

 

Fonte: Mundo Logística