Projeto de Serra vira aposta do governo para Ferrogrão
O governo busca acelerar a tramitação de um projeto de lei apresentado pelo senador José Serra (PSDB-SP) para tirar do papel a Ferrogrão, ferrovia de 933 quilômetros entre Sinop (MT) e Miritituba (PA) que se transformou em aposta do agronegócio para reduzir custos logísticos na maior região produtora de grãos do país.
A ideia do governo é viabilizar o megaempreendimento, estimado em R$ 12,7 bilhões, por meio de uma autorização – e não usando o modelo clássico de concessão. Se esse caminho for adotado, o plano da Ferrogrão não teria que passar previamente pelo Tribunal de Contas da União (TCU), e o ativo não se tornaria um bem público ao final do contrato. Também ficaria livre para fixar as tarifas no transporte de cargas.
O regime de autorização, mais flexível, tem sido usado com sucesso no setor portuário. Terminais privados já são responsáveis por dois terços da movimentação total de cargas. Em outras áreas da infraestrutura, novas instalações só podem ser construídas por meio de concessão.
O PLS 261, de autoria de Serra, cria o regime de autorização também para as ferrovias. A intenção era impulsionar as “short lines”, ramais ferroviários de curta extensão (normalmente com menos de 100 quilômetros), saindo das linhas-tronco operadas pelas grandes concessionárias. Nos Estados Unidos, por exemplo, existem 546 “short lines” em funcionamento.
O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, vê o projeto como ideal para a Ferrogrão. Na quarta-feira, em seminário organizado pelo Valor em São Paulo, ele deixou clara sua preferência em usar o mecanismo da autorização para viabilizar a ferrovia.
“[Em relação à] Ferrogrão, nós estamos estudando, para ver se conseguimos aprovar no Congresso o mais rapidamente possível a legislação que traz o regime de autorização para as ferrovias. A ideia é privilegiar o capital privado”, disse Freitas. “A partir do momento em que o setor privado tem interesse em fazer o investimento, ele vai e faz, é autorizado, não tem mais que se falar em exclusividade, em abertura de ferrovia para operador ferroviário.”
O projeto da Ferrogrão foi estruturado pela Estação da Luz Participações (EDLP), que tem ido atrás de investidores para a nova ferrovia. As quatro grandes tradings com atuação no país – Amaggi, Bunge, Cargill e Dreyfus – demonstraram interesse desde o início e prometem aportar recursos. O principal ganho será no escoamento da soja e do milho, que poderão ser transportados pelos trilhos até os portos fluviais de Miritituba, seguindo de lá por hidrovia até o embarque definitivo nos portos marítimos do Pará.
“Se ele [investidor] está afim de tomar o risco, vai ter exclusividade na operação da linha, vai ter perpetuidade”, disse o ministro. “O Brasil tem coisas que só aqui mesmo. O sujeito vai botar R$ 13 bilhões para fazer uma ferrovia ligando Mato Grosso aos portos lá do Norte. Imagina a licitação desse negócio. Isso não é buscar um parceiro, é quase buscar um trouxa”, disse Freitas. “Ele vai fazer uma licitação, submeter isso ao TCU. E, no fim das contas, vai ter o período de concessão e depois devolve porque isso é da União. Não faz o menor sentido. Por que isso não é autorizado? Você quer fazer, vá em paz e que Deus te acompanhe. Seja feliz, explore, a ferrovia é sua. Você vai ter exclusividade.”
O PLS de Serra, apresentado em maio de 2018, só começou a andar depois das eleições. Foi aprovado em dezembro na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e agora está na Comissão de Infraestrutura do Senado. Aguarda parecer do relator, Jean Paul Prates (PT-RN), que já conversou sobre o assunto com Freitas. Ainda precisa tramitar na Câmara.
Guilherme Quintella, presidente da EDLP, diz que o modelo de autorização seria bem-vindo na estruturação do negócio. Segundo ele, há vantagens como a não reversibilidade dos bens à União e maior facilidade na formatação das garantias financeiras. Quintella pondera que a concessão do projeto está relativamente encaminhada e não valeria a pena esperar demais pelo aval do Congresso ao PLS 261. Se o projeto for aprovado até setembro, estima, haveria tempo para adaptá-lo ao regime de autorização. Se não, para evitar mais demora, seria preferível prosseguir como concessão.
Por um caminho ou por outro, ele acredita que a Ferrogrão está perto de sair. “Há cinco anos estudamos todos os detalhes do projeto. Estamos com os riscos, ameaças e oportunidades mapeados.”
Fonte: Valor Econômico