Opinião

Os benefícios dos navios de carga à vela para a descarbonização prevista no acordo de Paris

O ano de 2015 foi marcado pela assinatura do Acordo de Paris sobre o Clima, congratulando-se com a adoção da resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas nº A/RES/70/1, intitulada como “Transforming our world: the 2030 Agenda for Sustainable Development”, dentre outros documentos internacionais que reconhecem que as mudanças climáticas representam uma ameaça urgente que requerem a mais ampla cooperação de todos os países em respostas internacionais eficazes, com vista a acelerar a redução das emissões globais de gases de efeito estufa.

É possível verificar que um dos principais objetivos do Acordo de Paris sobre o Clima é que todos os setores, incluindo a indústria naval, possam promover a descarbonização. Em suma, a descarbonização consiste no processo de redução de emissões de carbono na atmosfera, especialmente de dióxido de carbono (CO2). Com isso, o Acordo de Paris estipulou uma série de medidas para alcançar uma economia global com emissões reduzidas para conseguir a neutralidade climática através da transição energética.

Nesse contexto, recentemente foi noticiado o retorno dos navios cargueiros à vela, tal como um graneleiro japonês da MOL, armador que está operando um navio assistido pelo vento. Em conjunto, informado na mídia que a Empresa Americana de alimentos Cargill está trabalhando com o velejador olímpico Ben Ainslie para implantar WindWings em suas rotas; a Empresa de navegação sueca Wallenius pretende que a Oceanbird reduza as emissões em até 90%; e, a Start-Up francesa Zephyr & Borée construiu o Canopée, que transportará no presente ano de 2023 partes do foguete Ariane 6 da Agência Especial Europeia.

Trata-se de um fundamental avanço na descarbonização da indústria naval. A propósito, no ano de 2018, visando cumprir com o objetivo do Acordo de Paris, a Organização Marítima Internacional (IMO) estabeleceu a sua primeira meta de reduzir pela metade as emissões de navios entre 2008 e 2050. Embora haja algumas críticas, como a publicada pelo Climate Action Tracker de que reduzir pela metade as emissões não seria suficiente para manter o aquecimento global abaixo de 1,5, foi uma importante decisão proferida pela IMO, que terá revisão em julho de 2023.

Destaca-se que o PwC Net Zero Economy Index 2021 publicou um relatório de análise de como os países do G20 que atuam para descarbonizar suas economias a partir do rastreamento da taxa de transição de baixo carbono e frisou que a taxa anual de descarbonização no mundo necessária para chegar ao objetivo do Acordo de Paris de um aquecimento médio anual de 1,5ºC deveria ser cinco vezes maior que o ritmo atual.

Em igual sentido, o Maritime Executive destacou que o Projeto Ocean Bird visa reduzir as emissões de um navio em até 90%. Segundo a publicação deles, “(…) pesquisas confirmaram o potencial da propulsão eólica. O raciocínio é simples. A navegação responde por um bilhão de toneladas de dióxido de carbono por ano, quase 3% das emissões globais de gases de efeito estufa. Se a propulsão eólica economizar combustíveis fósseis hoje, o orçamento cada vez menor de carbono se estende um pouco mais. Isso, por sua vez, ganha mais tempo para desenvolver combustíveis alternativos, que a maioria dos navios precisará até certo ponto. Uma vez que esses combustíveis estejam amplamente disponíveis, precisaremos de menos deles porque o vento pode fornecer de 10% a 90% da energia que um navio precisa” – Texto publicado em 19 de fevereiro de 2023 pelo Maritime Executive.

Nesse contexto, não se pode olvidar as objeções ao transporte de propulsão eólica. As principais críticas se reduzem ao afirmar que os navios eólicos são coisa do passado, que o vento não é confiável e que os navios não chegarão a tempo, bem como que as velas não funcionam em todos os tipos de navios. Frisa-se que os novos navios movidos a energia eólica usam uma mistura de tecnologia nova e antiga para aproveitar o vento onde ele é mais comum: no Mar. Isso reduz a necessidade de combustíveis fósseis e de novos combustíveis alternativos que exigirão investimentos e espaço para novas infraestruturas terrestres, tanto para gerar eletricidade quanto para transformar essa energia em combustível.

Muito embora o vento possa parecer inconstante quando se está na praia, o mesmo não ocorre no mar, visto que os ventos alísios que impulsionaram a globalização permaneceram estáveis. E a previsão do tempo também melhorou significativamente desde os últimos dias de navegação. E o software de roteamento meteorológico ajuda a encontrar o melhor curso a seguir melhor do que qualquer um no século XIX.

Por último, ainda que nem todos os tipos de navios funcionem com velas, rotores ou pipas montadas em seus conveses. Isso pode ser devido ao tipo de navio, pois os maiores porta-contêineres não acomodam facilmente velas, por exemplo. Também pode ser por causa de onde ou como as embarcações operam – as águas sem vento da estagnação e os horários apertados das balsas representam desafios. Todavia, a corrida entre a Veer Voyage e a Windcoop para construir o primeiro navio porta-contêineres movido a vento continua. Então, talvez esses navios possam usar velas.

Disso ressai que a complexidade adicional de usar propulsão eólica e software de roteamento climático é uma pequena compensação para descarbonizar o transporte marítimo. Noutros termos, ainda que a navegação seja uma indústria conservadora, muitos outros navios movidos a vento serão lançados nos próximos anos.

Outrossim, é possível concluir que para as empresas de navegação o maior risco agora não é fazer um investimento ousado, é não investir em um futuro sustentável, através da maior propagação de atividades que contribuem com a descarbonização mundial, cumprindo, assim, com os objetivos do Acordo de Paris.

 

 

 

Fonte: Murilo Borges é advogado no Escritório Crippa Rey Advogados e Mestrando em Direito Internacional e Direito Comparado pela Universidade de São Paulo (USP)

 

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