Opinião

Milton Lourenço: Pragmatismo no comércio exterior

Dados de estudo preparado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostram que a indústria contribui, por ano, com R$ 1,2 trilhão para a economia brasileira, respondendo por 21% do Produto Interno Bruto (PIB), além de ser responsável por 32% da arrecadação de tributos federais e por 67% dos gastos em pesquisa e desenvolvimento do setor privado.

De acordo com o estudo, 51% das exportações brasileiras são de produtos industrializados, o que contraria pesquisa do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), segundo a qual as commodities (produtos primários agrícolas e minerais) respondem por 65% de tudo o que o Brasil exporta.

Mas, seja como for, o que é indiscutível é que o país precisa de uma política industrial mais definida, que possa atuar como instrumento de produtividade e de atualização tecnológica dentro de uma estratégia maior, que favoreça a ampliação da presença dos produtos industrializados brasileiros no mercado externo. Para tanto, é necessário que essa política industrial vá além de mero instrumento de defesa de subsídios para compensar a ineficiência do sistema produtivo.

Isto posto, é fundamental que a política de comércio exterior do novo governo seja firme em defesa dos interesses nacionais, sem se deixar levar por pruridos ideológicos de direita, que podem fazer tanto mal ao país quanto os de esquerda fizeram em tempos recentes.

Por exemplo: em 2005, os governos populistas do Brasil e da Argentina comemoraram o fracasso das negociações para a formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), proposta em 1994 pelo presidente norte-americano Bill Clinton com o objetivo de eliminar as barreiras alfandegárias entre os 34 países americanos, formando assim uma área de livre-comércio, que, englobada ao Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio (Nafta), seria o maior bloco econômico do mundo.

Ora, se a Alca tivesse saído em 2005, o Mercosul teria tido maior poder de fogo nas negociações com a União Europeia (UE) para a assinatura de um acordo comercial e arrancado dos europeus maior número de concessões. Hoje, esse poder de fogo não existe porque os europeus sabem que os sul-americanos não têm outra aliança de porte que possa implicar a perda de mercado para os seus produtos.

Se o governo Bolsonaro adotar uma posição de alinhamento automático com os Estados Unidos, em troca de benefícios para as exportações brasileiras, é possível que a UE volte a mostrar mais interesse nas negociações com o Mercosul. O que se viu até agora, porém, foram declarações atabalhoadas que preveem um esvaziamento do Mercosul, sem levar em conta que a Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil e importante mercado para os nossos manufaturados.

Ou manifestações extemporâneas em favor da transferência da embaixada do Brasil em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém, que pode criar dificuldades para os negócios das empresas brasileiras com clientes árabes. Ou ainda o discurso anti-China do então candidato Bolsonaro que, se confirmado em seu governo, poderá esfriar o relacionamento entre os dois países, que rendeu US$ 75 bilhões em 2017.

Em outras palavras: o que se espera é uma política externa séria e pragmática que estimule o crescimento do comércio exterior brasileiro. E não o contrário.

Fonte: A Tribuna

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