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Vagões viram sucata em estações ferroviárias no interior de São Paulo

Ao lado da antiga e descaracterizada estação de trens Juquiratiba, em Conchas (a 182 km de São Paulo), cerca de 20 vagões ferroviários abandonados e enferrujados dominam o cenário.

Em meio a ferros retorcidos, muitos eixos e outras peças de trens sendo corroídas pelo tempo, os vagões-tanque e de transporte de animais abrigados na cidade são uma amostra do lixo ferroviário que existe espalhado por ferrovias no interior de São Paulo.

O cenário de Conchas está longe, também, de ser exceção nas estações ferroviárias percorridas pela reportagem no interior, onde foram encontrados vagões destruídos total ou parcialmente pertencentes às extintas RFFSA (Rede Ferroviária Federal S.A.), Ferroban (Ferrovias Bandeirantes S.A.) e Fepasa (Ferrovia Paulista S.A.).

A reportagem percorreu 2.000 quilômetros de estradas, parte deles em vias de terra, em busca de estações “perdidas” por descaso, ou em locais hoje de difícil acesso, que pertenceram às companhias Paulista, Mogiana, Sorocabana, Araraquara e São Paulo-Minas, que originaram a Fepasa (Ferrovia Paulista S.A.), em 1971.

O cenário geral é de abandono e depredação. Houve casos em que a reportagem dirigiu 15 quilômetros em estradas de terra para chegar às estações, às vezes até sem energia elétrica, mas mesmo assim alvo de invasões e de depreciação do patrimônio público.

Em Conchas, logotipos da RFFSA estão estampados em parte dos vagões abandonados. Aliados a outro tipo de lixo, o doméstico, dão um tom lúgubre à estação, que tem como uma das moradoras a dona de casa Nádia Ferreira de Souza, 22.

“Não tenho para onde ir. Moro no bairro há cinco anos e vim para cá [estação] há dois. Os trens acordam a gente todas as madrugadas. No fim, acabamos nos acostumando”, afirmou. Outras três famílias dividem o imóvel da estação.

O prédio atual foi construído nos anos 50 e, além de invadido, sofreu descaracterizações com ampliações feitas por moradores –puxadinhos– e está em péssimo estado.

A estação Juquiratiba, que pertenceu à malha ferroviária da Estrada de Ferro Sorocabana, está em processo de incorporação pela União, de acordo com a SPU (Secretaria de Patrimônio da União), vinculada ao Ministério do Planejamento. A dona de casa afirma pagar aluguel ao “proprietário”, que, diz ela, mora na cidade.

Municípios como Pitangueiras e Altinópolis também têm vagões, ou resquícios deles, abandonados próximo a estações ferroviárias. Em Pitangueiras, um vagão leva marca da Ferroban, que venceu concorrência para operar a malha paulista da RFFSA em 1998 e, com este nome, não opera desde o início dos anos 2000.

Ele está ao lado da estação Passagem, que pertenceu à Companhia Paulista de Estradas de Ferro e hoje tem parte dela ocupada por um bar, administrado por Manuel Damasceno, 42, integrante de um movimento de sem-terra acampado no entorno.

“O bar já existia nas origens da estação, só o reativamos. Antes só tinha cabrito, vaca, cavalo e 20 centímetros de altura de fezes de animais aqui”, disse. O vagão, segundo ele, foi abandonado nos últimos anos no local.

“Parece ferro-velho, mas tem valor. Isso ainda está espalhado pelo estado todo e experimente pedir um vagão, não importa para o que seja. Você dificilmente conseguirá ou, se conseguir, quando for liberado para você a restauração já não valerá mais a pena”, disse o pesquisador ferroviário Ralph Mennucci Giesbrecht.

Já na estação que leva o nome de Altinópolis, dois vagões –um deles refeitório– são alvos constantes de pichações e vandalismo. Um carrega a marca da Fepasa, criada em 1971 e incorporada à RFFSA em 1998.

“Isso tudo é patrimônio que se perde. Muitos ficam em estado tão deplorável de tal forma que nem é possível recuperá-los”, afirmou Helio Gazetta Filho, diretor administrativo da regional Campinas da ABPF (Associação Brasileira de Preservação Ferroviária).

A associação opera um trem turístico entre a cidade e Jaguariúna e tem uma oficina para recuperação de locomotivas e carros de passageiros. Se for simples, a recuperação de um vagão não custa menos de R$ 200 mil.

DESTRUIÇÃO

Além de manter vagões destruídos em sua estação, Altinópolis é um caso emblemático também por ter sido uma importante rota da Estrada de Ferro São Paulo-Minas e por apresentar um histórico de destruição de suas estações ferroviárias.

Com vasta extensão territorial –928,96 quilômetros quadrados de área, segundo a fundação Seade–, a cidade de 15 mil habitantes teve 8 estações, graças à cultura cafeeira, até hoje um dos principais sustentáculos da economia loca, das quais 5 foram demolidas.

Como comparação, a capital tem 1.521,11 quilômetros quadrados e quase 12 milhões de habitantes.

Das construções remanescentes, uma fica na área urbana, exatamente ao lado de outra, desativada, enquanto a Águas Virtuosas, na zona rural, foi invadida há 18 anos.

Criada, ainda com outro nome, em São Simão em 1891, a São Paulo-Minas passou a ter a denominação pela qual ficou conhecida em 1902 e teve a rede de trilhos ampliada até 1911, quando chegou a São Sebastião do Paraíso (MG), de acordo com Giesbrecht.

De São Simão a São Sebastião do Paraíso, onde terminava, chegou a ter 22 estações em operação. Dessas, pelo menos 13 foram demolidas ou estão em avançado estado de deterioração.

Só quatro delas estão abertas e sendo bem utilizadas, abrigando museu, órgãos como o Corpo de Bombeiros ou associação da terceira idade.

Depois de ter sido a partir de 1968 administrada pela Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, foi uma das empresas que originaram a Fepasa. Não recebe trens de passageiros desde 1976.

Os de carga ainda resistiram até a década de 1990, quando a circulação foi suspensa. Foi o que faltava para que o trecho da São Paulo-Minas passasse a ser alvo de constantes furtos de trilhos.

Segundo a polícia e associações de preservação, só nos primeiros dez anos após o fim do tráfego de trens, foram furtados pelo menos 50 quilômetros de trilhos –a construção civil é um dos destinos.

Fonte: Folhapress

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