Trigo gaúcho ao gosto do freguês internacional
A Embrapa e a Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado do Rio Grande do Sul trabalham há quatro anos para profissionalizar a produção de trigo para exportação. O estado cultiva um tipo de trigo preterido no consumo interno, mas que tem demanda no exterior.
Há quatro anos, entidades do Rio Grande do Sul trabalham para estabelecer uma exportação de trigo que além de mais intensa, seja mais regular. O estado é o único no País onde há exportação, já que o Brasil é também importador do produto. Mas então, o que explica a venda ao exterior? “Às vezes, é mais competitivo exportar do que vender aos estados brasileiros. O brasileiro preza muito por um pão que seja branquinho. Tem lugares do mundo que o pão não tem farinha tão branca, porque não precisa ter coloração tão branca”, explica Paulo Pires, presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado do Rio Grande do Sul (Fecoagro/RS) sobre uma das caraterísticas do produto cultivado no estado do Sul: a coloração mais escura.
Em parceria com a Federação, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa Trigo vem trabalhando em técnicos de manejo e seleção de cultivares que atendam o padrão de exportação e não elevem o custo de produção local. “Para exportação nesse projeto temos focado na classe Doméstico com teor de proteína acima de 12,5% ou 13%”, destaca o pesquisador da Embrapa, João Leonardo Pires. As variedades são incluídas em diferentes ‘classes’, de acordo com o mercado que atendem. Entre as selecionadas pela Embrapa nesta empreitada estão a BRS Reponte e a BRS Belajoia.
No projeto, estão 32 cooperativas agropecuárias no estado, que produz o dobro do que consome. É aí que entram as vendas mais pontuais ao exterior. “O projeto visa ampliar a exportação. O Rio Grande do Sul exporta trigo desde 2003. Nesses 17 anos, houve exportações, inclusive para países árabes. Então, não é nada novo. É apenas o desenvolvimento de trabalho que visa ter uma especialização nesse fim [exportação]”, explicou Índio Brasil, sócio-diretor da Solo Corretora, no Rio Grande do Sul.
A corretora dá suporte comercial ao “processo, que ainda é embrionário”, explica Índio, e cuja venda final é feita através de exportadoras. Segundo o corretor, o que é desvantagem para o consumidor brasileiro, pode ser vantagem em outros mercados. “Toda embocadura de produção de trigo no Brasil está focada em produzir dentro do que o mercado nacional conceitua como sendo qualidade. Mas dentro de cada país há questões culturais e requisitos de qualidade não necessariamente nutricionais, mas relacionados a aspectos visuais e organolépticos”, afirmou.
Embora os embarques não sejam novidade, se firmar como exportador ainda é uma conquista. “Provavelmente, os árabes não nos reconhecem como players porque não somos previsíveis”, explica Paulo Pires. Essa imagem do Brasil lá fora tem motivo. Os dados da Fecoagro mostram que o volume embarcado do produto até maio de 2020 para a Arábia Saudita foi de 56 mil toneladas. O embarque anterior, porém, havia ocorrido três anos antes, quando em 2017 os sauditas compraram 62 mil toneladas do produto. Outro importante comprador, o Egito, recebeu sua última carga de trigo brasileiro apenas em 2013, com 66 mil toneladas.
A profissionalização da produção para a disputa internacional é um objetivo em comum apontado pelos entrevistados. “Fizemos esse projeto de exportação para ter competitividade. Isso ganhou força. Temos até o mercado como o africano, ou a própria Ásia, que gostam do trigo gaúcho”, disse presidente da Federação. A aposta do projeto é justamente a região asiática, em especial o sudeste asiático, e o Oriente Médio.
Do campo para fora
O projeto é pensado para incentivar o produtor, que vinha deixando de cultivar trigo. “O produtor estava reduzindo a área de trigo. Para nós, foi um recado claro que não estava contente. Fomos tentar um projeto alternativo, queríamos que ele aumentasse a área”, relatou Paulo Pires, acrescentando que nesta safra o plantio cresceu 21%, impulsionada também pela alta do dólar que encareceu a importação do produto.
Entre as exigências do mercado internacional, além do teor de proteínas totais nos grãos, está a chamada ‘força de glúten’, que abrange os trigos das classes comerciais Básico ou Doméstico. Para chegar a esse resultado, mais do que desenvolver novas cultivares, a Embrapa selecionou aquelas que atendiam a necessidade sem elevar custos. “Temos cultivares que dão conta de produzir esse trigo da exportação tranquilamente”, revelou o pesquisador sobre o trabalho de identificar e selecionar as melhores cultivares.
Fonte: ANBA