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Secretário nacional de Portos e Transportes Aquaviários analisa formato de gestão pública dos portos

O Ministério da Infraestrutura deve ver os primeiros resultados de seu projeto de privatização dos portos a partir do segundo semestre do próximo ano. No caso de Santos, este é o prazo previsto para a concessão da gestão de serviços do complexo, como a administração do canal de navegação. Já a abertura de capital da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), a Autoridade Portuária, pode levar os quatro anos do Governo. A análise é do secretário nacional de Portos e Transportes Aquaviários, Diogo Piloni, que coordena essas ações. Com exclusividade a A Tribuna, ele ainda explica os planos do Ministério para o cais santista. Confira os principais trechos da entrevista a seguir.

AT – Secretário, o Ministério da Infraestrutura tem buscado a privatização do setor portuário ou, dependendo do caso, uma maior participação da iniciativa privada na gestão de portos ou de serviços prestados nos portos. Qual o objetivo deste plano?

A melhoria da eficiência de gestão. Basicamente é o que a gente espera. Há um histórico. Nós estamos falando de um setor que teve uma grande reforma em 1993. Essa reforma trouxe a iniciativa privada para as operações portuárias no modelo landlord tradicional, praticado mundo afora. Desde então, as operações portuárias tiveram ganhos de eficiência muito grandes, de modo que, hoje, a gente pode dizer que temos operações portuárias que são comparáveis às de qualquer porto de classe mundial, em números de movimento por hora, em nível de eficiência. Agora, essa eficiência acaba esbarrando em alguns papéis que são desempenhados pela Autoridade Portuária, que hoje detém a gestão do condomínio, dos artigos comuns, que tem obrigações tais como manutenção dos ativos de uso comum, como canal de acesso, acesso terrestre, serviços que são prestados. E muitas vezes esses serviços mal prestados geram impeditivos piores ao desenvolvimento de uma maior eficiência da prestação do serviço como um todo.

AT – Quando o sr. fala dos problemas causados pela falta de eficiência dos gestores, a que o sr. se refere? Dificuldades na contratação dos serviços de dragagem, como ocorreu recentemente em Santos?

A problemas de todas as espécies. Uma das questões é a dificuldade de contratação. Mesmo para o bom gestor – e nem sempre a gente teve historicamente, nos últimos anos, referências de gestor, de executivos com atenção à observação do comprimento de meta. Mas mesmo quando a gente tem gestor com este perfil, ele ainda fica com dificuldade de ter uma flexibilidade, uma agilidade comparável, às vezes, a de terminais de uso privado instalados a poucos metros do porto público. E essas decepções não são só de contratações de serviços, de dragagem. Às vezes até no que diz respeito à contratação de pessoal, ao dimensionamento das companhias conforme a real necessidade que elas têm. Então esse formato de gestão pública – e aí falo na qualidade de servidor público de carreira, que acredita em gestão pública eficiente -, para os portos organizados, tem se mostrado ineficiente aos resultados que se espera para o País. E a prova disso é o
movimento histórico que estamos tendo de tomada de share de mercado que esses terminais de uso privado, se comparados a terminais dentro de portos organizados. Ano após ano, o porto público acaba perdendo mercado e, obviamente, uma das razões para isso acontecer é uma assimetria concorrencial.

AT – Em Roterdã, nos Países Baixos, as autoridades criaram uma empresa privada com controle acionário público para a gestão do porto. É um modelo como esse que o sr. pretende implantar?

Exatamente, algo parecido com isso. É o que a gente espera. E veja que a gente não está aqui desistindo da gestão pública. Nós continuaremos a ter uma convivência entre portos administrados pelo poder público, autoridades portuárias públicas, e autoridades portuárias privadas. E nessas administrações privadas, também há de se observar questões que são intrínsecas ao poder público e precisam ser tuteladas, do ponto de vista do interesse público. Esses contratos que terão de ser celebrados, esses modelos que serão desenhados, devem observar, obviamente, a atratividade do parceiro privado, agora devem observar também o importante valor público que muitos desses ativos que nós vamos estudar têm economicamente falando.

AT – Quando o sr. fala em privatizar uma administração portuária, trata-se de uma concessão a um ente privado ou a criação de uma empresa privada sob o controle do poder público?

Vai depender do complexo de que estamos falando. Nós não vamos ter uma solução única. Há portos complexos, por exemplo, como o Porto de Santos, que tem cerca de 60 operadores. Isso são cerca de 60 contratos de arrendamento, fora outros contratos, contratos operacionais, termos de cessão de uso. Tem uma série de fatores que fazem com que a gente observe Santos como um exemplo em que a gente não tem uma página em branco para escrever. Então a solução de abertura de capital para um caso como esse, como tem sido proposta pelo presidente da Autoridade Portuária, o Casemiro Tércio, faz algum sentido, faz mais sentido em um porto muito complexo como o Porto de Santos. Mas nós temos outros portos que não têm nenhuma operação privada. Você não tem lá um problema que nós vamos ter de enfrentar, que é o seguinte: o eventual conflito de interesse entre o privado administrador portuário e o privado operador portuário. No contexto de abertura de capital, tem alguns cenários que podemos avaliar. Um cenário possível é você abrir capital mantendo o controle de tudo. Isso, por um lado, traz uma vantagem, do ponto de vista de manter uma gestão pública sobre esse ativo. Por outro lado se perde a possibilidade de ter um modelo de gestão mais ágil, que não tenha de necessariamente observar a Lei das Estatais, algo que vai gerar uma agilização de contratações. Então nós vamos ter de fazer estudos e teremos de fazer um estudo caso a caso. A gente tem como premissa geral uma maior participação da iniciativa privada na gestão, mas essa participação vai depender do caso que estivermos estudando.

AT – No modelo de abertura de capital, o governo pode ter uma goldenshare, como já acontece em empresas controladas pela União?

É uma possibilidade e nós somos, até confesso, meio simpáticos a ela. É uma possibilidade interessante pois tem os ganhos da agilização de gestão, que uma empresa privada tem, mas por outro lado, mantêm-se ali alguns pontos que são caros, que dizem respeito a interesse público, preservados. Então é, sim, uma possibilidade, uma possibilidade interessante.

AT – Como estão os estudos para a privatização dos portos? Já começaram? O BNDES fará de todos?

A estruturação tem diversas alternativas. Vou citar um exemplo. Os portos da Codesa (Companhia Docas do Espírito Santo) já têm projetos qualificados no PPI (Programa de Parceria de Investimento) desde 2017. Eles já estão em fase avançada de contratação de consultoria e, nesse caso, pelo BNDES. O BNDES é o nosso parceiro natural. Eles fizeram a abertura do edital de contratação e já receberam as propostas. Até o final do mês, mais tardar a primeira, segunda semana de maio, já teremos contratos assinados, começando as reuniões do projeto. Esse é um caso em que a gente optou por uma estruturação via BNDES. Em outro caso que a gente está estudando, a gente já teve manifestações expressas e públicas dos governos estaduais para entrar nesse pacote de estudo. Suape, no caso do Governo do Estado de Pernambuco, já demonstrou interesse. São Sebastião, no Estado de São Paulo, já demonstrou interesse. E Itajaí, em Santa Catarina, também demonstrou interesse.

AT – E como estão os estudos de privatização de Santos?

O que nós temos em Santos é um plano de curto prazo em que se estuda a concessão de serviços. E aí começaríamos estudando concessão do serviço do controle de acesso aquaviário, do controle de acesso terrestre, de serviço de tratamento de resíduos, estudos estes pela Autoridade Portuária, que está com uma excelente equipe da área comercial. Estão fazendo isso, obviamente, dentro de casa. E em algum momento vão propor ao Governo Federal e nós vamos analisar em conjunto. Já estamos discutindo, mas quando chegar o estudo de fato vamos fazer uma análise formal. E há um plano de médio prazo, que envolve a abertura de capital. E até lá, há um dever de casa. Obviamente que a Autoridade Portuária deve ser toda reestruturada, organizada, para que se tenha condições de se ter uma governança adequada a uma abertura de ações.

AT – Tornar a Codesp mais atrativa ao mercado?

Mais atrativa, mais transparente na sua gestão. O parceiro privado não entra se não tiver algumas premissas bem estabelecidas.

Voltando aos estudos, nesse momento, estamos discutindo como vamos apoiar os governos estaduais. É bom que se diga que essas empresas estaduais e municipal são portos delegados a governos estaduais e municipal, mas que a atribuição, a competência original é da União. Então a gente vai ter de fazer algo a quatro, seis mãos. E aí, assim, a gente vai poder lançar mão de alternativas como o BNDES, ou estruturação via PMI (Procedimento de Manifestação de Interesse), que a gente tem a possibilidade de abrir por aqui nos moldes que o setor aeroportuário tem feito com bastante sucesso. E isso a gente está estudando exatamente neste momento essa estruturação. Já fizemos algumas reuniões com os governos estaduais e municipal (no caso de Itajaí) e já temos alinhamentos feitos com algumas premissas que os governos estaduais têm nos passado. Agora é colocar isso na linha do tempo e montar o plano de ação, que inclui, obviamente, como primeiro passo a estruturação, a contratação de consultoria.

AT – Um ente público não visa lucro, mas um ente privado sim. Ao privatizar a gestão portuária ou mesmo a gestão de serviços portuários, como evitar que a entrada da iniciativa privada nessas funções acabe aumentando os custos do setor?

Primeiro a gente tem estudado isso. Embora o modelo de transferência das atividades que, hoje, são de competência da autoridade portuária para a iniciativa privada não seja um modelo predominante no mundo, nós temos estudado os casos em que isso ocorreu. Os casos mais antigos são os britânicos, mas também temos estudado casos bem recentes, principalmente na Nova Zelândia e na Austrália. Temos analisado discussões acadêmicas e do mercado sobre o resultado desses exercícios mais recentes. E um dos pontos que têm sido colocados, que a gente tem observado, é exatamente o efeito em aumento de tarifas cobradas pelas autoridades portuárias. Então obviamente que isso é uma preocupação que tem de ser tutelada, que tem de ser observada na modelagem, na estruturação. É obvio que o administrador privado vai buscar a maximização dos lucros, mas ele não poderá fazer isso a bel prazer. E a gente tem discutido como tutelar essa questão dentro dos contratos de concessão que serão assinados. Além disso, as operações portuárias têm preço livre, o mercado já entende essa característica de busca pelo lucro, no entanto, isso não afasta a obrigação da agência reguladora de regular os preços, principalmente os abusos de mercado. A ação da agência é primordial para que casos que venham a ferir o ambiente econômico saudável sejam tutelados, regulados. Então a gente tem esse racional no âmbito da discussão que faremos e, se formos competentes, e seremos, isso será objeto de tratamento seja do ponto de vista contratual, seja do ponto de vista regulatório.

AT – Quando os modelos de privatização que estão sendo estudados serão definidos?

Como a gente vai fazer essas discussões com muita calma, com muito cuidado, pois são discussões paradigmáticas, de quebra de paradigma, a gente quer fazer isso sem pressa, sem açodamento. Estamos propondo alternativas de gestão e esse modelo tem de ser bem estudado antes de qualquer implementação. Então esse é um projeto inevitavelmente para 2020, para o segundo semestre de 2020.

AT – A definição do modelo ou a sua implantação?

Os cronogramas nós estamos montando, mas o nosso feeling é que são projetos que serão entregues a partir do segundo semestre de 2020. Os modelos estão sendo desenvolvidos ao longo deste ano. Mas já devem estar implantados a partir do segundo semestre de 2020.

AT – Em relação a Santos, o sr. falou de projetos em curto prazo, para a concessão da gestão dos acessos terrestres e aquaviário, e a médio prazo, para a abertura de capital. Qual é esse médio prazo?

Sobre médio prazo, nós estamos falando de uma ação para o final do governo, de deixar um legado. Isso depende de reestruturação da companhia, que é pesada, que tem bastante passivos. Não é nada que se fará em um curto prazo. Sem dúvida, a abertura de capital de Santos é algo bem complexo. A estrutura de governança que precisa ser feita para abrir esse capital, para que faça sentido termos um parceiro privado, que faça sentido para o parceiro privado, demanda uma série de passos que precisam ser tomados ao longo de três, quatro, cinco anos.

AT – E as medidas a curto prazo são para quando?

Os processos, fora a estruturação, os estudos que podem demorar um pouco mais, mas o processo como um todo respeita mais ou menos as mesmas etapas. Então, inevitavelmente, não tem nada que a gente consiga fazer com um prazo muito mais curto do que o segundo semestre de 2020. Há de se fazer isso com a pressa de quem quer dar resultado, mas com a parcimônia de quem quer deixar algo estruturante e positivo para o setor.

Fonte: A Tribuna

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