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Privatização dos portos é exemplo de resiliência, diz Carlos Kopittke

Em um momento difícil para instalações portuárias que operam líquidos no Porto de Santos, diante da falta de dragagem em berços utilizados para embarque de produtos químicos e combustíveis, o momento é de preocupação. Mas para o presidente da Associação Brasileira de Terminais de Líquidos (ABTL), Carlos Kopittke, a confiança do investidor está voltando, e o Porto de Santos precisa estar pronto para atender à demanda que vai surgir.

O executivo também destaca a necessidade de discussão sobre os modelos de desestatização da Autoridade Portuária e o que esperar da nova empresa. Confira na entrevista a seguir.

A Tribuna – Na sua opinião, quais foram os pontos fortes e fracos do primeiro ano do Governo Jair Bolsonaro?

Carlos Kopittke – Considero que o fato de confiar seu mais importante ministério a uma equipe efetivamente preparada, com uma clara visão de mercado, com viés antiburocracia e descentralizador foi sua maior conquista. Reconheço que não é fácil mudar a orientação de toda uma máquina e, assim, considero este o ponto mais forte do seu governo até aqui. Agora, ainda é muito cedo para fazermos uma avaliação mais abrangente, é preciso dar mais tempo à sua equipe, mas os resultados estão aparecendo, a confiança está voltando.

AT – E como o senhor avalia o desempenho da iniciativa privada nos portos brasileiros?

CK – A iniciativa privada nos portos brasileiros é um exemplo de resiliência enorme. Apesar de se encontrar num ambiente econômico hiper-regulado com viés centralizador e comando afastado das peculiaridades regionais, tem conseguido apresentar resultados impressionantes de eficiência e performance e segue sua busca por uma maior liberdade para investir e atrair novos investidores apostando numa garantia de segurança jurídica e regulatória com respeito aos contratos.

AT – O que ainda pode melhorar nos portos brasileiros nos próximos anos? E como isto deve ser feito?

CK – A melhora pode advir exatamente por meio da segurança para investir, da garantia de fiel observância daquilo que foi combinado e contratado e, não menos importante, da descentralização das administrações portuárias e a escolha de profissionais efetivamente experientes e preparados, com a cabeça voltada ao mercado e o apoio ao efetivo desenvolvimento ao setor, não por meio de slogans ou manchetes, mas de efetiva busca incessante de resultado sempre com foco na dinâmica do mercado.

AT – Quais são as suas expectativas para o futuro das operações de líquidos no Porto de Santos?

CK – No momento, estamos vivendo uma situação extremamente preocupante para o segmento, pois a principal função de um Porto de garantir calado e berços em condições operacionais satisfatórias não está sendo atendida.

Os terminais de líquidos atendem toda uma cadeia de indústrias químicas em sua hinterlândia, além de se constituírem em elo fundamental da garantia da segurança energética do Sudeste e Centro Oeste. Se com os baixos níveis de crescimento já estamos tendo problemas de tal gravidade, imaginem quando o país voltar a literalmente pisar no acelerador e demandar cada vez mais combustíveis e insumos importados.

AT – Há necessidade de novos berços?

CK – Outro fator crucial para garantir a demanda de líquidos da região é a construção de novos berços. Todos os berços de líquidos do Porto de Santos hoje estão com taxas de ocupação acima de 80%, quando o máximo aceitável está em torno de 65%. Já em 2004 os terminais solicitaram providências à autoridade portuária, chegando a doar um projeto executivo completo com estudo de manobrabilidade ao custo de mais de R$ 4milhões.

Com as novas regras previstas no Decreto 9048/17, que prevê a possibilidade de financiamento de investimentos em áreas públicas por parte de usuários mediante ressarcimento por meio de tarifas futuras, os operadores voltaram à autoridade portuária, firmando a intenção de executar este investimento. Até agora estão sem resposta.

O mesmo vale para os terminais da Ilha Barnabé, que igualmente doaram projeto para o aumento do número de berços, condição para atender o crescimento de tancagem e demanda. Hoje, para executar uma manutenção dos ativos existentes, corre-se o risco de paralisar uma grande parte das já defasadas condições de atendimento ao mercado, aumentando as já excessivas filas de espera e os enormes custos de sobreestadia.

Se houvesse uma continuidade de administração com planejamento de longo prazo e a devida execução de investimentos inadiáveis, hoje não estaríamos vivendo estes graves problemas.

AT – Como esses resultados serão alcançados?

CK – Com planejamento criterioso, plano de ação dentro da realidade, onde todos deverão ser ouvidos e suas reivindicações discutidas e observadas. Não é possível que continuemos a receber as fórmulas feitas em gabinetes distantes onde muitas vezes não se foca o mais importante em detrimento do mais conveniente.

AT – O que se deve esperar em relação ao Porto de Santos nos próximos anos?

CK – O Porto de Santos precisa melhorar seus acessos, tanto hidroviários quanto rodo e ferroviários, para que a carga possa chegar e sair na maior rapidez e eficiência possíveis. Precisa prover uma solução eficaz para a manutenção de seus cais de atracação, seu canal de acesso, suas bacias de evolução para garantir rápidas e seguras manobras, com ganho de tempo e resultados.

Ao mesmo tempo, deve examinar sua melhor estratégia e definir seu modelo futuro, seja continuando nas mãos do governo mas descentralizado, seja concedendo seu controle à iniciativa privada como foi de 1890 a 1980.

AT – Qual é a sua opinião sobre o processo de privatização do cais santista?

CK – Acho que é uma das opções em cima da mesa, precisa definir como fazer e trazer à discussão pública, afinal o Porto é um ativo que pertence a toda sociedade e pode, bem administrado, gerar resultados seja privatizado ou continuando como um equipamento estatal. Note que eu falei bem administrado, o que significa um Porto enxuto, dirigido por profissionais competentes e sujeito às modernas regras de gestão precisa embutir a garantia de cumprimento de todos os contratos vigentes.

AT – Quais devem ser as principais premissas e objetivos da nova empresa?

CK – Respeito aos contratos existentes, foco no mercado e agilidade para atender eventuais novas demandas e manutenção de acessos, calados e qualidade dos berços sempre no estado da arte com estabelecimento de regras para o uso do canal, que é seu maior patrimônio.

AT – Na sua opinião, como a desestatização pode impactar de concessão do canal de navegação do Porto de Santos?

CK – Na minha opinião não se deve dissociar uma coisa da outra, o Porto desestatizado deve continuar a ser responsável pela manutenção plena do canal, até porque um não subsiste sem o outro.

AT – E na relação Porto-cidade?

CK – Não vejo como uma eventual desestatização do Porto possa impactar negativamente nesta relação, ao contrário, no lugar da relação tripartite que vemos hoje, federal, estadual e municipal, veríamos uma relação normal de uma empresa com seu entorno.

AT – Na sua opinião, o que é necessário para incrementar as operações portuárias no Brasil?

CK – Demonstrações claras de respeito aos contratos por meio de segurança jurídica e regulatória devem ser o foco do que vale para a frente, até porque não conseguiremos atrair investimentos sem o cumprimento destas premissas. Os operadores hoje atuantes no espaço portuário são de classe mundial, os equipamentos na sua maioria são de última geração com índices de performance em linha com os melhores mundiais.

Precisa desatar o nó regulatório, limitar a burocracia e confiar na autorregulação dos diversos agentes atuantes, evitando o excesso de ingerência regulatória em todos os níveis, sempre visando a excelência no apoio aos esforços de crescimento da participação brasileira na corrente de comércio internacional.

Fonte: A Tribuna

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