O desafio da transformação dos negócios no setor de óleo e gás, por Victor Venâncio
A necessidade de atendimento aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, as exigências ambientais da sociedade, as novas fontes energéticas, o novo perfil de consumo e os projetos de pesquisa e desenvolvimento impulsionam a busca pela transformação dos negócios na área de óleo e gás.
Entretanto, o uso exagerado de termos como digitalização, indústria 4.0 e transformação digital tanto em artigos acadêmicos como em publicações empresariais requer que o constructo destes termos sejam entendidos para que as estratégias das corporações sigam de forma consistente para a respectiva execução.
Quando se fala em digitalização, significa migrarmos atividades que eram feitas de forma analógica, para um novo formato usando ferramentas digitais. Por exemplo, na automação industrial, onde usávamos sensores analógicos e passamos a usar sensores com sinais digitais. Na área corporativa, quando deixamos de usar um controle em planilhas e processos manuais e passamos a usar sistemas computacionais. A digitalização acontece há alguns anos e não gera, em si, nenhuma vantagem competitiva para as empresas. É uma questão de sobrevivência mesmo.
A indústria 4.0 trata da adoção de tecnologias emergentes que, juntas ou isoladamente, proporcionam melhores desempenhos operacionais, comerciais e de segurança. Dentre essas, destacam-se a Robotic Process Automation (RPA), ou seja, uso de robôs para automatizar tarefas repetitivas da área corporativa, machine learning, Inteligência artificial e cognitiva, análise de dados, integração de sistemas, simulação digital de um produto físico (Digital Twin), impressão 3D, internet das coisas (IoT e IIoT), computação em nuvem e cyber-segurança.
Já a transformação digital, leva as organizações a terem novos modelos de negócios, gera novas fontes de receitas e propiciam uma relação completamente diferenciada com o mercado. Para isso, o uso massivo de tecnologias convencionais e emergentes, uma cultura organizacional aberta à inovação, bem como processos industriais e corporativos bem desenhados, são vitais para sustentar a transformação dos negócios nas organizações que seguem essa jornada.
Ter uma estratégia para alinhar a automação com os objetivos da organização se torna fundamental para melhorar o grau de competitividade das empresas, sejam elas produtoras de petróleo, fretadores de plataformas ou FPSOs (unidades flutuantes de armazenamento, produção e transferência de óleo e gás) ou mesmo, fornecedores de equipamentos e serviços. Entretanto, a maioria das empresas atuantes na cadeia de valor do setor de óleo e gás no Brasil, ainda atuam com tecnologias da era da indústria 3.0.
O primeiro passo para uma jornada efetiva pela transformação dos negócios é a convergência entre os sistemas de gestão das operações industriais ( OT – Operations Technologies ), representado pelos sistemas de controle das plantas industriais e processos fabris, e os sistemas de gestão da informação da área corporativa ( IT – Information Technologies ), representado pelos sistemas ERP ( Enterprise Resource Planning ). À esta etapa inicial da jornada pela transformação digital, denominamos como ” Convergência OT & IT ” .
A convergência OT & IT nos possibilita usar os ativos existentes de modo estratégico, fazendo-os gerar mais valor, sendo, portanto, o primeiro passo para a jornada pela transformação digital que impactará todo negócio.
Já no que diz respeito à cultura organizacional, trabalhar as dimensões culturais que impactam o relacionamento entre os funcionários dos mais diversos departamentos e níveis hierárquicos, bem como a recepção dessas novas tecnologias nas rotinas diárias, representa um dos fatores críticos para o sucesso da estratégia de transformação dos negócios.
Mesmo que a tecnologia seja adotada, a cultura pode retardar ou mesmo inviabilizar o êxito dessa implementação. Daí a necessidade de uma visão mais abrangente sobre o que está além da tecnologia numa estratégia de transformação dos negócios.
Empresas do ramo de óleo e gás cresceram baseadas em ativos tangíveis e com forte cultura de desempenho operacional. Um programa de transformação dos negócios requer visão sobre o intangível, com a qual muitos profissionais do setor ainda não estão familiarizados. Sem um trabalho constante de adequação da cultura organizacional aos novos tempos que estamos vivendo, todo esforço e investimento pela transformação dos negócios poderá ser em vão.
Por fim, tanto na área industrial como na corporativa, os processos são vitais para que os resultados da convergência OT & IT sejam percebidos pela organização.
Não adianta automatizar processos que não estejam adequados ou sejam ineficientes.
Melhorar os processos transmitirá aos colaboradores a mensagem de que a empresa está trabalhando para facilitar o dia a dia das atividades deles, podendo resultar em mais tempo para se dedicarem ao entendimento das novas tecnologias, obterem novas competências ou mesmo terem mais tempo livre para iniciativas de intraempreendedorismo, por exemplo.
Atuar no pilar de processos, em paralelo ao da cultura e da tecnologia, ajudará na concretização da transformação dos negócios.
Entendido a importância dos três pilares: Tecnologia, Cultura e Processos, fica muito claro o imperativo pela transformação dos negócios para a sobrevivência e sucesso das empresas que atuam no setor de óleo e gás. Seja qual for a área de atuação dentro da cadeia de valor da indústria, o negócio será muito impactado por estas mudanças.
É vital que cada empresa esteja consciente e atenta aos riscos que corre em não se atualizar. Numa perspectiva de país, o Brasil precisa ser mais ágil na passagem da era da indústria 3.0 para a 4.0.
A nova dinâmica dos mercados e as mudanças comportamentais dos consumidores e da sociedade, é um desafio constante para todas as empresas, mas é preciso vencer as barreiras do presente e agir estrategicamente para garantir o futuro.
Sobre o autor: Victor Venâncio é sócio-diretor de automação, indústria 4.0 e transformação digital da KPMG no Brasil
Fonte: TN Petróleo