Indústria estima movimentação de até R$ 2 bilhões a partir de TACs de conteúdo local
Nova norma da ANP, em discussão, prevê reversão de multas por descumprimento de índices contratados em compras locais, o que pode representar oportunidades para setor de bens e serviços.
Representantes da indústria nacional de bens e serviços estimam que os termos de ajustamento de conduta (TACs) de conteúdo local têm potencial de movimentar até R$ 2 bilhões, entre aportes diretos e indiretos. A nova regulamentação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que está em discussão, tem como objetivo reverter multas aplicadas por descumprimento de compromissos de conteúdo local em investimentos, de forma a estimular a indústria brasileira. No final de setembro, a ANP realizou audiência pública sobre a minuta da norma sobre a regulamentação dos TACs que compreende fases já encerradas dos contratos de exploração e produção.
Na ocasião, o superintendente de conteúdo local da ANP, Luiz Henrique Bispo, destacou que a proposta visa apresentar, de forma clara e objetiva, qual será o rito para análise e aceitação dos pedidos de celebração de TAC e também para o acompanhamento e fiscalização desse compromisso e as consequências de um eventual descumprimento.
O diretor-executivo de petróleo, gás natural, bioenergia e petroquímica da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Alberto Machado, considera a resolução dos TACs de extrema complexidade, pois demanda uma análise criteriosa dos prós e contras para que um segmento não seja favorecido em detrimento de outro. Para Machado, a ANP está consciente dessa questão, fazendo reuniões com os principais atores.
“O conteúdo local, quando foi colocado, não era multar nem criar problema para as IOCs (international oil companies), e sim para induzir e motivar compras no Brasil”, ponderou Machado. Ele acrescentou que essas empresas já têm fornecedores habituais e modos de comprar, o que gera comodidade e confiança em comprar com habitual. No entanto, Machado disse que, durante a pandemia, os fornecedores locais comprovaram garantia de fornecimento para as encomendas e contratações realizadas no Brasil.
A Abimaq entende que os TACs visam o melhor uso da multa, no sentido de devolver oportunidades para os vendedores prejudicados (indústria de bens e serviços) quando a empresa não cumpriu os índices de conteúdo local. A avaliação é que os termos serão formatados para evitar insegurança jurídica e que a ANP consiga reverter para que os investimentos ocorram no Brasil e os valores sejam direcionados para compras locais.
Para Machado, os prestadores de serviços levam certa vantagem porque alguns dos serviços, como instalação e perfuração, não são ‘importáveis’. “Tudo está sendo bem discutido com seriedade. Na ANP, estão sendo cautelosos e abrangendo todas as possibilidades, visitando tudo que pode acontecer. Não adianta fazer um TAC que não dá resultado prático. Importante fazer relação ganha-ganha porque as empresas de petróleo acabam tendo certo compliance. Multa nunca é bom para a administração”, analisou.
As cláusulas de conteúdo local estipulam um percentual mínimo de contratações de bens e serviços que devem ser realizadas no Brasil. Desde a 13º rodada de licitações da ANP, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) determinou a adoção de novo modelo de conteúdo local e permitiu a adoção de exigências distintas daquelas vigentes nos contratos passados, o que resultou na resolução ANP 726/2018 e na possibilidade de aditamento dos contratos vigentes com fases não encerradas para que esses pudessem incorporar os aprimoramentos resultantes da evolução regulatória. No entanto, por questões jurídicas, a mudança regulatória não pode ser aplicada a contratos extintos ou a fases já encerradas. Foi proposto então que esses casos não contemplados pelo aditamento sejam tratados por meio de TACs, de adoção facultativa pelos concessionários.
A expectativa do setor é que os TACs ajudem a movimentar empresas estabelecidas no país, gerando empregos e oportunidades locais. O diretor da RBNA Consult, Luis de Mattos, avalia que, por motivos diversos, nem sempre é possível atingir o conteúdo local mínimo acordado. Ele acredita que os TACs são a melhor alternativa para quando essa meta não é atingida. Mattos observa que o conteúdo local é uma prática internacional de contrapartida prevista em contratos de concessão para exploração de campos de petróleo.
Para Mattos, as receitas originadas de multas não são interessantes para ninguém, na medida em que a concessionária gastou sem ter retorno e que o Estado arrecadou sem ter recebido o que realmente almejava. Ele destacou que o TAC transforma a multa em novos investimentos de conteúdo local. “Nova oportunidade para a concessionária contratar empresas estabelecidas no país. Ao invés de gastar dinheiro com multa, a concessionária usa essa verba para adquirir bens e serviços. A sociedade, aqui representada pelo Estado, ao invés de receber um dinheiro de multa, recebe a movimentação da economia através dessas contratações, gerando emprego e renda. É a solução perfeita para operadoras e fornecedores”, analisou.
Mattos considera que o Brasil tem tradição de manter seus contratos, o que é importante para evitar insegurança e criar um ambiente de estabilidade jurídica importante para atrair investidores. Segundo o consultor, o tema foi bastante debatido, o que ajuda a mitigar as principais dificuldades. Ele estima que o potencial de investimento gerado pelo TAC é proporcional ao potencial de multa pelo não-cumprimento do investimento inicial acordado.
Mattos ressaltou que o recurso do TAC será direcionado para alavancar o setor, diferente da multa que vai para a União. “O recurso será usado na contratação de bens e serviços de empresas estabelecidas no Brasil, gerando subcontratações de mais bens e serviços, acarretando em geração e manutenção de empregos diretos e indiretos, aumentando renda e consumo e movimentando a economia. O potencial de investimento gerado pelo TAC é gigantesco”, projetou.
Fonte: Portos e Navios