Há 150 anos, o Porto crescia por decreto
A participação da iniciativa privada nas operações do Porto de Santos é um dos principais temas de discussão no setor atualmente. Mas a pauta é mais antiga do que parece. Há exatos 150 anos, em 13 de outubro de 1869, sob o reinado de Dom Pedro II, era publicado o edital para a privatização do complexo santista por um prazo de 90 anos. Para especialistas, o texto, moderno para a época, foi fundamental para o desenvolvimento do setor portuário brasileiro.
O então ministro e secretário de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas do Império, Joaquim Antão Fernandes Leão, foi o responsável pelo processo, deflagrado com a publicação do Decreto nº 1.746.
O objetivo era a contratação da “construção, nos diferentes portos do Império, de docas e armazéns para carga, descarga, e guarda e conservação das mercadorias de importação e exportação”.
José Pinto de Oliveira, Cândido Gaffrée, Eduardo Palacin Guinle, João Gomes Ribeiro de Aguilar, Alfredo Camilo Valdetaro, Benedito Antônio da Silva e Barros e Braga & Cia. ganharam a concorrência para exploração do Porto e criaram a Companhia Docas de Santos (CDS).
Pouco tempo após a concessão, em 1892, foi concluída a construção de 260 metros de cais. Com isso, foi inaugurado o primeiro trecho de porto organizado do País, com a atracação do navio inglês Nasmith, em 2 de fevereiro daquele ano.
Segundo o presidente da Federação Nacional dos Operadores Portuários (Fenop), Sérgio Aquino, diversos outros países seguiram o mesmo caminho e permitiram a exploração e construção de portos mundo afora.
“A primeira coisa que isso demonstra é que o Brasil insiste em buscar um caminho para não dar certo. Inicia, abandona e desvirtua processos, além de não adotar as melhores práticas”, destacou o executivo. Ele se refere às mudanças impostas pela legislação brasileira, que a afastam investidores e criaram um ambiente de insegurança jurídica.
O consultor portuário Frederico Bussinger tem opinião semelhante. “Curiosamente, parece que retrocedemos em relação às (boas) experiências deixadas por D. Pedro II quando da implantação das primeiras ferrovias e portos, ainda no Século 19 (Decreto nº 641/1852 e Decreto nº 1.746/1869). Ou da Light, na primeira metade do Século 20, que explorava/geria bondes, energia, atividades imobiliárias; entre outras atividades”.
Regras
O edital previa, entre outras coisas, a aprovação do Governo Imperial das plantas e dos projetos de obras que os concessionários pretendiam executar. Os empresários também foram autorizados a calcular tarifas, que posteriormente foram aprovadas pelo governo.
“Será revista esta tarifa pelo Governo Imperial de cinco em cinco anos; mas, a redução geral das taxas só poderá ter lugar quando os lucros líquidos da empresa excederem a 12%”, dizia o texto.
Para Aquino, trechos como este mostram a modernidade do texto. “Ele é coerente com o que é correto nos dias de hoje. Quando se concede algo com conceito de público e não há concorrência, é importante que o poder público estabeleça parâmetros. A regulação é inversamente proporcional ao nível de concorrência. Nos dias de hoje, com uma quantidade imensa de terminais, o mercado se controla”.
Já o consultor portuário Fabrizio Pierdomenico aponta que o decreto, que permitiu a exploração e a construção do Porto de Santos, possibilitou a modernização das operações com uma remuneração justa, que era o percentual sobre a carga movimentada.
“Neste texto, há elementos regulatórios presentes até hoje na legislação, como a revisão de tarifas e a regulação dos lucros”, afirmou Pierdomenico.
Fonte: A Tribuna