Governança portuária: há alternativas às jabuticabas!
Consultor, engenheiro e economista Frederico Bussinger analisa os modelos de gestão do setor
“No mundo inteiro, terminais querem estar dentro dos portos. Por que no Brasil preferem ficar fora [dos portos organizados/públicos]?” O painelista, especialista europeu com atuação em várias dezenas de países, nos cinco continentes, pegou-nos de surpresa e silenciou a plateia.
Mais que uma curiosidade, a questão posta indica que algum desajuste deve ter havido no arranjo portuário brasileiro: enquanto TUPs vêm experimentando boom no passado recente (positivo para o país!), as reformas dos/nos portos públicos, balizadas pela lei de 1993, depois de uma década de sucesso (tema de artigo anterior), perderam impulso. Como explicá-lo?
A localização de TUPs “dedicados” segue a conveniência da cadeia produtiva, mas aqueles que atendem “cargas de terceiros” geralmente estão junto aos portos públicos: a hipótese de mercado, pois, deve ser descartada. Também a de propriedade e gestão, visto que arrendamentos são administrados por empresas privadas tanto quanto TUPs. É curial: a explicação deve ser outra!
Instalações portuárias são milenares. Há oito séculos, foi concebido e implantado o primeiro “landlord port” em Hamburgo (1188).
O manual do Banco Mundial define: “modelo no qual o setor público é responsável pelo planejamento portuário, atua como órgão regulador, é proprietário e/ou administra terrenos e infraestrutura básica de uso compartilhado. Tais ativos são normalmente disponibilizados, sob remuneração, a empresas operadoras privadas ou para indústrias… Os operadores privados fornecem e mantêm… seus próprios equipamentos… e são responsáveis por suas operações”.
Tal modelo foi sendo gradualmente adotado mundo afora: hoje, quatro em cada cinco portos. Nessa saga multicentenária, ele foi adaptado e aperfeiçoado com contribuições de diferentes culturas, sistemas econômicos, regimes políticos e ambientes sociais. Preservou, entretanto, suas características genéticas básicas: I) autonomia; e II) separação das funções de autoridade e operação.
Apesar de instituição pré-colombiana, ele segue tendo reavaliado e repensado seu futuro; mesmo em seu berço, a Europa. Por exemplo: desde os anos 70, é feita periódica pesquisa sobre temas relacionados à governança portuária; atualmente sob condução da European Sea Ports Organisation – ESPO (https://www.espo.be) – da mais recente participaram 116 autoridades portuárias, de 26 países, responsáveis por 2/3 das cargas continentais.
Alguns fatos e conclusões podem ser destacadas por seu potencial de generalização: I) A maioria das autoridades portuárias é pública. A quase totalidade sob administração municipal ou regional. II) (Mais) descentralização e autonomia (funcional, gerencial e financeira) é quase mantra. III) Operações são majoritariamente privadas. IV) Crescem dificuldades das AP para financiar, autonomamente, expansões visando atender às novas gerações de navios. V) Maior “transparência” é vista como imprescindível nas relações público-privada; principalmente nas outorgas e suas renovações. VI) Muitos propugnam que as AP deixem de ser “meros landlord” e passem a ter papel mais ativo na relação com o mercado, nas conexões com outros modais, na retro área, junto às suas comunidades e regiões, e sobre a gestão ambiental.
Há muito mais: vale lê-la na integra… Seja como subsídio à resposta ao painelista, seja para se dar conta que há alternativas às jabuticabas.
Fonte: A Tribuna