Exportação não é vital para economias como a do Brasil, diz economista americana
Exportações são apenas um meio de conseguir importações e não fazem uma economia crescer. A afirmação foi feita pela economista americana Deirdre McCloskey, durante um evento com empresários e representantes do agronegócio, em São Paulo (SP). Para ela, grande parte do que pode melhorar uma economia como a brasileira, por exemplo, está no mercado interno.
“Sei que vocês estão no agronegócio e que acreditam, com seus corações, que as exportações são vitais para a economia. Eu lhes digo uma coisa: vocês estão errados. Exportação não é a mesma coisa que renda. É apenas um meio de adquirir importações”, afirmou, em palestra.
Deirdre McCloskey é defensora do liberalismo. Nasceu Donald, em 1942, e, na década de 1990, fez a mudança de gênero com a qual se tornou Deirdre, também relatada em livro: Crossing, de 1999. Recentemente, lançou Why Liberalism Works? How True Liberal Vales Produce a Freer, More Equal, Prosperous World for All (Por que o liberalismo funciona? Como os verdadeiros valores liberais produzem um mundo mais livre, próspero e igual para todos).
Professora da Universidade de Chicago (EUA), onde estudou, por exemplo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, ela esteve no Brasil em janeiro. Uma passagem que não deixou de lado a polêmica. Uma palestra que daria na Petrobras foi cancelada. Dias antes, ela tinha dito, em uma entrevista, que o governo do presidente Jair Bolsonaro é “qualquer coisa, menos liberal”.
O encontro com empresários do agronegócio foi promovido pelo escritório de advocacia Diamantino, que atua no setor. “A maior parte da vida de vocês está aqui, ligada ao comércio interno. Brasileiros comercializando com brasileiros. É um país grande. Não são as exportações que farão a economia crescer. Tenho atacado essa ideia durante grande parte da minha carreira”, reforçou, na conversa com Globo Rural.
Não significa ignorar o comércio internacional nem a necessidade de alguns países importar produtos dos quais necessitam. Se um país precisa de soja, por exemplo, irá comprar de outro. “E espero que compre do Brasil”, diz a economista. Mas ela critica a ideia de um governo incentivar vendas externas. “O livre comércio é bom, mas deixe as pessoas sozinhas”, afirma.
Questionada sobre como o liberalismo funcionaria em um setor como a agricultura, que é subsidiado em várias partes do mundo, a economista se posiciona contra subsídios. E diz que a política econômica não deve levar ao fortalecimento do que chama de “pequenos grupos”, mas olhar a sociedade como um todo.
“Há uma confusão em relação a isso. Pensam que o que é bom para pequenos grupos é bom para a economia. O Brasil deveria fazer o que é bom para os brasileiros como um todo, não só para os brasileiros da agricultura. A política agrícola americana é pior que a europeia. Nem Estados Unidos nem Europa deveriam fazer tanto pela sua agricultura”, analisa.
Para Deirdre McCloskey, a agropecuária tem algumas ameaças pelo caminho. Uma, segundo ela, é o desenvolvimento das proteínas cultivadas em laboratório ou mesmo os substitutos vegetais para carnes, que vem ganhando espaço no mercado, inclusive no Brasil, com cada vez mais opções para o consumidor.
“Isso tende a crescer e grande parte da agricultura do seu país e do meu está relacionada à alimentação animal. Estaremos indo das plantas direto para a carne sem o animal. Pode ser bom para as pessoas em termos de saúde, mas significaria uma grande porção de terra não mais usada em cultivos para a ração dos animais. E terá que ser feita outra coisa”, diz.
Conceito errado
Na visão da economista, tanto nos Estados Unidos, seu país natal, quanto na América Latina, tem ocorrido uma aplicação errada do sentido de liberalismo. Entre os americanos, diz ela, chamar alguém de liberal é semelhante a chamar de social democrata, ou um socialismo light. No Brasil, alguém visto como liberal é, quase sempre, um conservador.
“É um erro. No restante do mundo, em sua origem histórica, significa uma sociedade onde não há escravos. É sobre igualdade em um sentido profundo. O que não é natural em sociedades agrícolas, mas é natural em nossos genes”, diz.
Quando fala nessa igualdade em sentido profundo, a economia argumenta que não se limita apenas a garantir igualdade de renda e de oportunidade. Isso funciona, em sua visão, em pequenos grupos, mas em grandes sociedades, só funciona quando há o que ela chama de igualdade de dignidade.
“A igualdade de oportunidades não é o centro da questão porque os filhos e filhas das pessoas que estão aqui nesta sala têm uma vantagem sobre as pessoas mais pobres do Nordeste”, afirmou, dirigindo-se à plateia. “Igualdade de respeito é a chave”, acrescenta.
Deirdre McCloskey rebate a ideia, segundo ela, propagada por muitos de seus colegas economistas, de que o investimento impulsiona uma economia. Na visão da economista liberal, eles são uma engrenagem necessária, mas de nada servem se não estiverem ligados a uma ideia brilhante, o que, por sua vez, só surge com liberdade.
“Investimento é necessário, as leis são necessárias, a luz do sol é necessária, discursos são necessários, o amor é necessário. Todas essas coisas são necessárias, mas não são suficientes sem uma ideia brilhante. O que precisamos é de liberdade. É o que faz a economia crescer mais rápido”, diz ela.
Fonte: Globo Rural