Alta do dólar após queimadas na Amazônia pode afetar Polo de Manaus
Especialistas são categóricos ao afirmar que a tensão diplomática entre o Brasil e a comunidade internacional devido às recentes queimadas na Amazônia, e a alta na temperatura das relações comerciais entre Estados Unidos e China, impactaram diretamente o valor de compra e venda do dólar americano, que fechou em R$ 4,59, maior patamar deste ano. De acordo com economistas consultados por A Crítica, a alta pode afetar a exportação de produtos do Polo Industrial de Manaus (PIM).
O dólar americano é cotado nas casas de câmbio de Manaus no valor de R$ 4,59, já o Euro é cotado a R$ 5,12. O valor representa um aumento histórico, desde a corrida eleitoral de outubro passado, com alta de 1,32%. Antes da eleição presidencial, a moeda era negociada a R$ 4,14.
“As variações cambiais são decorrentes do cenário político, econômico e, agora, ambiental. A situação conturbada e os ajustes nas contas fiscais públicas do país causam uma alta do dólar”, afirma o economista Ailson Rezende, consultor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam).
Essa conjuntura também repercutiu na bolsa, que perdeu o patamar dos 100 mil pontos. O Ibovespa, principal índice acionário do país, teve queda de 2,34%, fechando a 97.667 pontos, na última quarta-feira (28).
Com risco
A política fiscal do Governo Federal é vital para a estabilidade da moeda brasileira em relação à americana. Mas há ainda um fator mais subjetivo que pode mudar a oferta e demanda de dólares no Brasil: a percepção de investidores sobre os riscos no país. Se eles acham que investir no Brasil pode ser arriscado por algum motivo, optam por colocar dinheiro em aplicações consideradas mais seguras, em outros países.
Para fazer isso, eles recorrem ao dólar, então, com mais procura, o “preço” do dólar sobe, e reflete em um movimento de desvalorização do real.
Quem perde
A alta das moedas estrangeiras reverbera nas demandas do mercado de consumo, ou seja, se existe uma alta no preço do dólar ou do euro, produtos que são produzidos no PIM sofrem alteração significativa no preço final, desestimulando a exportação de produtos como celulares, bicicletas, microcomputadores, chips, aparelhos de transmissão digital, televisores, telas de LCD, entre outros eletrônicos.
Causado pela alta da moeda americana, o cenário de pouco estímulo das exportações do PIM produz um efeito cascata que a médio prazo pode resultar no aumento do estoque das empresas, e que resulta no desequilíbrio dos valores reais dos produtos.
“O impacto mais desastroso é na elevação dos preços dos produtos fabricados no Polo Industrial de Manaus, que utilizam insumos importados na sua composição. Insumo mais caro, produto final com preço mais elevado”, afirma Ailson.
Preços são fundamentais na decisão do consumidor em tempos de crise econômica, de acordo o economista, levando-o à compra de outro produto similar com preço menor.
No caso do PIM, países que regularmente compram do Brasil, por conta dos incentivos da Zona Franca de Manaus (ZFM), como a China e os do continente Europeu, acabam optando por adquirir produtos de outras zonas de livre comércio, como Bangladesh, África do Sul ou a Índia, que possuem filiais das empresas que competem no mercado brasileiro, a partir da ZFM, como a gigante de eletrônicos, Samsung.
A exemplo da instabilidade comercial no Brasil, com a redução dos incentivos em janeiro deste ano, e a alta dos juros, a finlandesa Siemens e a norte-americana Pepsi decidiram sair da ZFM e investir nas filiais concentradas no sudeste asiático. A estabilidade do preço do dólar nestes países foi vital para tomada de decisão, de acordo com um memorando do CIEAM, publicado em janeiro deste ano.
Desconfiança
“A instabilidade política é o ponto central. Não é apenas o desmatamento. É como o Governo tem lidado com esta situação. As declarações do presidente acirram uma disputa que não é positiva para os investidores internacionais”, afirma o economista Eduardo Cézar, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), que complementa: “Devido à falta de emprego, devido aos conflitos, essa discordância de ideias entre o presidente e alguma parte da população, gera instabilidade no mercado”, garante.
“As queimadas na Amazônia, sem um plano de contingência do Governo Federal, ou Estadual, podem gerar sanções ao país, inclusive proibição de venda de produtos industrializados, o que provoca insegurança ao investidor estrangeiro”, conclui Eduardo.
Desconfiança de Macron
A França ameaçou votar contra o acordo histórico da União Europeia com o Mercosul, firmado há um mês e considerada uma das conquistas da atual política econômica do governo brasileiro, por conta das queimadas na região Amazônica nas últimas semanas.
“Dada a atitude do Brasil nas últimas semanas, eu só posso constatar que o presidente Bolsonaro mentiu para mim na cúpula (do G20) de Osaka”, declarou o presidente Emmanuel Macron, no Palácio do Eliseu, sede do Governo Francês, na segunda-feira (26), estimando que “o presidente Bolsonaro decidiu não respeitar seus compromissos climáticos nem se comprometer com a biodiversidade”, afirmou.
Vitrine embaçada
Até o momento, os esforços do Governo Federal para reduzir os focos de queimadas na Amazônia não surtiram efeito no cenário econômico e nas relações bilaterais. A Finlândia, a Noruega e a Suécia decidiram avaliar a permanência, ou não, nos acordos comerciais firmados com o Brasil. “Atualmente, a preocupação ambiental para decisões econômicas é bem grande e a Amazônia é a vitrine do maior bioma do mundo. Preservar a Amazônia é uma medida simpática mundialmente”, conclui o consultor do Cieam, Ailson Rezende.
Fonte: A Crítica